segunda-feira, 12 de agosto de 2013






Degustação:

A Fonte da Juventude

“Mocidade. Mas mocidade é tarefa para mais tarde se desmentir.”
João Guimarães Rosa – Grande Sertão: Veredas

Os alquimistas buscavam a fonte da eterna juventude, entre outras coisinhas básicas e simples desse tipo.
Essa é a fonte que muita gente busca e, surpreendentemente, encontra com a maior facilidade. Na verdade a fonte da juventude nem precisa ser procurada, ela é dada de graça a todos. Não existe nada oculto e misterioso neste mundo e tudo está tão revelado, tão óbvio, na nossa frente, tudo pronto para o uso. Nós é que não conseguimos enxergar ou ler direito a vida e, às vezes, confundimos as coisas.
É na fonte da juventude que a maioria das pessoas mergulha, porém elas se esquecem de que essas águas estão sempre fadadas a diminuir, ou seja, essa é a fonte que seca a cada dia e quem permanecer nela ficará desidratado e morrerá de sede. Talvez o melhor seja realmente descobrir e identificar essa fonte, mas para sair dela o mais rápido possível!
Parece-me melhor e mais garantido mergulhar o quanto antes na fonte da velhice, pois essa é a fonte cujas águas aumentam com o passar do tempo. Nela você estará seguro. Nunca haverá sede e sempre haverá água em abundância; seu corpo não se ressecará e sempre será refrescado; se a fonte encher demais, você terá tempo suficiente para aprender a nadar; se for água demais para você, compartilhe-a com os outros; quanto mais velho você estiver, mais água brotará da sua fonte e será bom que os jovens sedentos venham beber daquilo que você puder oferecer.
Quanto mais cedo aceitarmos a velhice e mergulharmos na sua fonte, menos o tempo nos ressecará.

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Para Você Viver Mais - Sergio Prado (degustação)



"Nunca pensei um dia chegar
Te ouvir dizer:
Não é por mal
Mas vou te fazer chorar
Hoje vou te fazer chorar"

John Ulhoa (Pato Fu)


 
1 - A Convocação



“Cada uma que me arrumam!”, foi o que pensei sem nada dizer, porque quem “arrumou” foi meu superior imediato. Depois de mais de vinte anos trabalhando com um afinco inquestionável, o desaforado me disse que eu precisava ter mais envolvimento com áreas diferentes da minha. Convidou-me para participar da equipe de Cuidados Paliativos do hospital... Para quem não sabe do que se trata, são profissionais encarregados de acompanhar os enfermos considerados incuráveis, doentes de vida breve. Praguejei contra a função ao receber o convite, que só não recusei pela subordinação e longa amizade com meu chefe, o qual fez seu pedido soar como uma convocação militar, sem me dar a chance de opinar. “Agora vou ser babá de...”, não digo o resto da frase, por arrependimento e pela vergonha que hoje sinto de ter utilizado um termo pejorativo para complementar tão infeliz pensamento. Vergonha que eu senti somente quando comecei a exercer a atividade que, na época, eu repelia, chegando a brincar com amigos ao dizer que eles faziam o pré-velório.
Muito é dito sobre as pessoas que atravessam problemas de saúde e conseguem a cura, fala-se muito também sobre os que tiveram experiências pós-vida, experimentaram a morte, ou foram experimentados por ela, e voltaram do rápido aperitivo que ambos tiveram um do outro, reservando-se o banquete principal para mais tarde. Entretanto, quase nada se diz sobre aqueles que estão à deriva, ao sabor da “banguela” que, por capricho, valoriza em adiamentos sua visita definitiva. Falarei um pouco sobre como vivem, ainda que brevemente, quem na demora da morte se faz paciente.